Em outra mesa estava uma mulher, e não havia mais nenhum cliente. Um dos empregados veio e perguntou ao poeta:
— O que deseja tomar?
— O mesmo que aquela mulher ali — respondeu o poeta.
A mulher da mesa ao lado tomou ar de quem ia dizer alguma coisa, mas não disse. Tinha mais de trinta anos; era loira, com os lábios pintados de vermelho baço, e um traço denso de lápis preto em redor dos olhos grandes e tristes. Usava um vestido negro, bastante decotado, e sapatos de salto alto. O poeta olhou-a e, nesse olhar, disse-lhe que a achava desejável. “Mais uma gentileza gratuita”, pensou.
O empregado reapareceu com uma garrafa de uma bebida tropical e um cálice mal lavado. Serviu o licor e tornou a afastar-se. O poeta, já homem de Abril, saboreou a bebida, num breve trago, e acendeu um cigarro.
A mulher de negro tinha as pernas curtas e maciças, as ancas largas, os seios pequenos, e dormia a olhar para a escuridão do tecto, como se estivesse prisioneira.
O poeta bocejou. Não estava com paciência para aqueles poemas. (Por exemplo: o cabelo da mulher agarrado à nuca, sem uma mão de carícias para lhe dar soltura — equilíbrio — dimensão; as longas horas de vigília a olhar para o tecto vazio, desprovido de luz, peso frio da parede, chão da gente do andar de cima).
O homem velho retomou a leitura do jornal.
O poeta acabou de tomar a sua bebida, pagou-a e saiu. Entrar e sair de lugares era uma das suas especialidades quotidianas.